Pegadas de Jesus

Pegadas de Jesus

quinta-feira, 22 de junho de 2017

A DINÂMICA DA VIDA


Uma noite fria, mais uma. O céu negro e estrelado. Algumas estrelas cintilavam tanto que pareciam querer me dizer algo, alguma coisa. E eu ali, embevecida, a contemplar aquele espetáculo pela enésima vez. Meu corpo entre quatro paredes, e minha visão transbordando a vastidão do infinito. Um silêncio tocante. Parecia que algo saia de mim, que não cabia em mim, que queria alcançar o infinito, o inalcançável. Era tão bom sentir aquilo. Quantas vezes eu me recolhia àquele pequeno espaço para contemplar Deus, nas estrelas, na imensidão do firmamento. De todas as coisas criadas, a visão da abóbada celeste é a que mais me impressiona, e me emociona. É como uma saudade, uma vontade de voltar pra casa.Como se alguém que me ama muito estivesse à minha espera, contando os minutos para minha chegada. É meu encontro com Deus.

Sinto um movimento na minha alma. Vêem-me à lembrança algumas pessoas, que Deus colocou no meu caminho. Penso nelas. No que vive cada uma. No porquê de Deus ter me colocado no caminho delas. Decerto que foi para aprender. Sou grata por isso.

Duas experiências de vida diferentes. Para mim uma missão desafiante. Por um lado o vigor e o desabrochar da vida dos jovens adolescentes, alegres, impulsivos, irrequietos, curiosos, inocentes ainda, eufóricos pelas novas descobertas, pelo anseio de se lançar na vida, no mundo, de se autoafirmarem, de se sentirem aceitos, importantes, sem muito jeito ainda de lidar com essa fase da vida, tendo até momentos de rebeldia, querendo impor suas vontades, achando que já sabem tudo, mas tão frágeis para qualquer situação inusitada.

Por outro lado, o extremo da vida, o outono, o momento da inutilidade, das limitações, das dores e sofrimentos, da solidão e do medo, do vazio ou da sabedoria da vida. Idosos visitados pelas enfermidades, com dificuldade de locomoção, alguns até presos à cadeiras de rodas, ou vítimas de seus próprios corpos mutilados, lesionados, sem capacidade de reação aos estímulos naturais.

O fulgor da juventude contrastando com a chama bruxuleante da velhice. E que lição de vida, meu Deus! O que dizer a cada qual? Falar de amor, de esperança, de caminhos.

Ser jovem com os jovens, tentar falar a mesma linguagem, conhecer os gostos, animar, advertir, tentar mostrar um tantinho da grandeza do amor de Deus. Desenvolver com criatividade jogos interessantes, a partir dos quais se ofereça a temática que deva ser trabalhada, correndo o risco de não alcançar a sintonia deles, dada a diferença de nossas gerações.

Com os idosos, outra pedagogia, outra maneira de chegar junto, de alcançar o coração, a confiança, e de poder transmitir o ânimo e a alegria do evangelho, da boa notícia. Sinto, por vezes, o medo que eles sentem, a nostalgia, as incertezas, a indignação diante da impotência e inutilidade. E como animá-los? Deixo a cargo do Espírito Santo. O que poderia eu dizer? Como alentar? Mas, tudo posso, naquele que me fortalece, bem disse o apóstolo Paulo, e nessa confiança, congratulo-me com eles, e os faço entender que Deus é fiel, e que com coragem devemos cumprir nossa missão no mundo, pois, os desígnios de Deus, às vezes incompreensíveis, são retos, e um dia, na vida eterna que nós cremos, entenderemos a nossa história.

E assim, olhando fixamente as estrelas, enquanto um arrepio na pele me faz estremecer, vou recomendando a Deus os meus amigos, e esboço um sorriso, e sinto uma paz tão grande, que tenho certeza, Ele me sorri do outro lado, e acolhe a minha humilde prece. E eu ali, embevecida, ante aquele céu negro e estrelado, pela enésima vez.

Por Socorro Melo

quarta-feira, 14 de junho de 2017

ENTRE PANELAS E OUTRAS COISAS MAIS




Depois de tanto tempo, precisei assumir em casa, algumas atividades domésticas. Nunca fui muito habilidosa com tais atividades, apesar de gostar da minha casa limpa e cheirosa, mas, quando necessário, arregacei as mangas e me pus a serviço. Dessa vez, porém, era diferente, pois não seria por um curto espaço de tempo, mas, por tempo indeterminado. E cozinhar, era o que eu mais temia. Vi-me angustiada.

Naquela tarde, senti-me desprotegida. O peso da responsabilidade com as atividades do lar, concomitantes com o trabalho fora de casa, crescera assustadoramente, e me tomara de pavor. Pensei que não seria capaz de enfrentar a jornada. Certamente o pouco tempo livre que me restava, seria insuficiente para atender a demanda que me esperava.

Passados os minutos de tensão, deixei as lamúrias de lado, e encarei a situação de frente. Pus as mãos na massa, não sem sentir as dificuldades próprias. Entanto, o fato de desempenhar as atividades, não significava fazê-las com gosto.

Sempre fui adepta da teoria de trabalhar com amor, pois, além de tornar mais fácil o ofício, nos rende paz interior, todavia, os dias se passavam e eu não conseguia executar com amor as minhas atividades domésticas, principalmente a preparação dos alimentos, e isso me deixava preocupada.

Fazia todos os dias, de forma mecânica, por obrigação, o que tinha que ser feito. Por vezes resmungava, e me queixava. De outras oportunidades, me entristecia, pois, queria fazê-lo com ternura, com ânimo, mas, não conseguia.

Juntou-se a essa situação um cansaço redobrado, pois, passei a cumprir um terceiro expediente. Sentia raiva de não ter um tempo livre para cuidar de mim, para ler um livro, ver um filme, ou simplesmente relaxar.

Quando parava para pensar na questão, batia-me um desânimo, pois, não via luz no fim do túnel. As atividades que eu desempenhava, eram essenciais, e eu não poderia deixar de realizá-las, um dia, sequer. Também não cogitava em transferi-las para outra pessoa, uma auxiliar, por exemplo. E pensava, constantemente, no que mais eu poderia empreender, para livrar-me delas, porém, não vislumbrava nada.

Certa feita, num dos poucos momentos prazerosos a que dediquei meu escasso tempo, ouvi uma frase que me impulsionou, e referia-se a fazermos um propósito, e tentarmos cumpri-lo, por amor a Deus. Achei oportuno, e já encaixei a minha situação neste contexto: iria fazer o meu propósito, pois, somente Deus, ou tão somente por amor a Ele, eu talvez conseguisse o meu intento. E assim o fiz.

Pedi ao Senhor, da forma mais despretensiosa que foi possível, que me ajudasse a cumprir minha tripla jornada de trabalho com prazer, por amor a Ele, e a minha querida família. Que eu me despojasse do meu egoísmo, e da minha má vontade, e tornasse as coisas mais fáceis para mim mesma, pois, talvez eu estivesse fazendo grande tempestade num copo d´água.

Por um instante, num flash imaginativo, tive uma visão do futuro: não tinha mais por perto a minha família, e eu daria tudo, naquele instante, para me debruçar sobre a pia e o fogão, para preparar-lhe as refeições, mas, eles não estavam lá, eu estava só. Um grande medo me invadiu a alma, e tomei consciência de que, deveria abrandar meus sentimentos de rejeição pelo trabalho do lar, e fazê-lo com todo o meu carinho, pois, era por Deus e pelos meus, que eu estava fazendo.

Pensei em quantas mães estavam agora chorando, ao redor de panelas vazias, pedindo a Deus que lhes desse pão, para servir aos seus filhos, e eu ali, reclamando por ter que fazê-lo. Isso me deu um arrependimento incomensurável, e reforçou a minha vontade de mudar de paradigma.

Toda mudança começa na vontade, e no pensamento, depois, vem à ação concreta, conseqüência da mudança interior. Percebi, após alguns dias, que as tarefas já não me incomodavam tanto, e que eu já as realizava sem tanta aversão, e isso me deixou contente, pois, como teria que fazê-las, melhor que as fizesse com serenidade.

Isto não significou a ausência do cansaço, pois, seria impossível, nem que eu, de repente, descobrisse talentos para a culinária e habilidades domésticas, visto que não tenho mesmo vocação, porém, trouxe-me tranqüilidade, e um jeito novo de me portar, sem me consumir de angústia e ansiedade. Tento a cada dia preparar as refeições e organizar outras tantas tarefas, com zelo e pensando no bem estar da minha família, e num processo contínuo tenho buscado cumprir o meu propósito. E assim é.

Por Socorro Melo


quarta-feira, 7 de junho de 2017

A PLENITUDE DA VIDA





A RESSURREIÇÃO: PLENITUDE DE VIDA



Porque te afastas para longe na busca dos bens da tua alma e do teu corpo? Ama o único Bem, no qual estão todos os bens, e tanto te bastará. [...] Lá no alto, está tudo aquilo que se pode amar e desejar.

É a beleza que amas? «Os justos resplandecerão como o sol» ( Mt 13,43). É a agilidade e a força de um corpo livre e desembaraçado de todos os obstáculos? «Eles serão como os anjos de Deus» [...] É uma vida longa e sã? Lá em cima espera-te a saúde eterna, pois «os justos viverão eternamente» (Sab 5, 16) [...] Desejas ser saciado? Sê-lo-ás quando Deus te mostrar o seu rosto na sua glória (Sl 16,15). Estar embriagado? «Eles ficarão embriagados da abundância da casa de Deus» (Sl 35,9). É um canto melodioso que te agrada? Lá no alto, os coros angélicos cantam sem fim os louvores do Senhor. Procuras as delícias mais puras? Deus dar-te-á de beber na torrente das suas delícias (Sl 35,9). Amas a sabedoria? A sabedoria de Deus manifestar-se-á em pessoa. A amizade? Eles amarão a Deus mais do que a si próprios, amar-se-ão uns aos outros tanto quanto a si próprios, e Deus amá-los-á mais do que eles alguma vez podem amar. [...] Amas a concórdia? Eles terão todos uma só vontade, pois não terão outra vontade senão a de Deus. [...] As honras e as riquezas? Deus dará muitos bens aos seus servos bons e fiéis (Mt 25,21); mais ainda, «Eles serão chamados filhos de Deus» (Mt 5,9) e sê-lo-ão na realidade, pois onde está o Filho, aí também estarão «os herdeiros de Deus e os co-herdeiros de Cristo» (Rom 8,17).

Santo Anselmo (1033-1109), monge, bispo, doutor da Igreja 
«Proslogion», 25-26