Pegadas de Jesus

Pegadas de Jesus

sábado, 20 de maio de 2017

MONÓLOGO

Imagem da Net


Um dia nos encontramos, em um imenso jardim. E era primavera. Você por mim se encantou, e juntos, traçamos lindos planos de voo. E voamos, em direção ao infinito.

Empreendemos a caminhada. Partimos com alegria, com entusiasmo, definimos a meta, e nos comprometemos a superar o calor, o frio, a fome, os insetos, e tudo mais que encontrássemos pelo caminho...

Depois me vi sozinha. Você se deslumbrou no meio da estrada, e enveredou por atalhos, talvez impressionado com novas cores, ou quem sabe, com novas flores, e me deixou prosseguir sozinha, com o coração dilacerado pelo medo, pela tristeza, mas especialmente, pelo desencanto e pela solidão.

Vi minhas ilusões esmaecerem. Esvaíram-se como nuvens, que se dissipam no céu. Perdi as cores. Perdi as asas. Chorei todas as lágrimas, e delas me alimentei por dias sem fim...

A estrada tornou-se íngreme. Vieram subidas, descidas, precipitações. Por vezes o frio da saudade e da desilusão me prostrou, mas, firmei os pés na caminhada, confiante de que o calor da minha fé iria me conduzir ao meu destino. Destino? Que destino? Eu só via a estrada sem fim, desenrolar-se diante dos meus olhos, que tristes, a seguiam sem vacilar.

E onde estava você, nos meus dias de inverno? Por certo se inebriando, no doce néctar das flores. Você vivia a primavera. Você sempre optou pela primavera, como os beija-flores.

E eu, senti o frio do desprezo gelar meus ossos. Enxuguei do meu rosto, tantas vezes, o suor, as lágrimas, que misturadas com a chuva fina do meu inverno, disfarçavam a melancolia que eu carregava na alma.

Caminhei lentamente, com os olhos perdidos no horizonte. Segurei-me em braços e abraços... E numa bela manhã, a estrada, serpenteada de flores silvestres, foi tornando-se mais bela, pois rebentavam a cada novo olhar, brotos de esperança.

O peso dos meus sonhos desfeitos, e dos castelos que desmoronaram no ar, tornou-se mais leve. Eu via luz no fim da estrada. E caminhar passou a ser um deleite, porque eu apreciava minha própria companhia. E finalmente estava liberta. As asas se renovaram. E via com alegria o sol se derramar sobre as encostas, e sobre as escarpas, e um céu azul sem nuvens, lavado, se estender pela vasta imensidão.

E a vida renascia em cada flor, em cada novo cheiro, até mesmo nos arbustos e cactos, e na correnteza que me ensinava que tudo passa e que tudo deve seguir seu caminho, que tudo se transforma, que nada permanece igual, assim como os novos sentimentos de libertação, e de vitória, que se aninharam em meu renovado coração.

E quando eu vivia a primavera, quando todos os botões e flores me sorriam, e prometiam-me a docilidades dos frutos, eis que você volta, e por um atalho da vida, invade minha estação, cheio de promessas.

E assim eu o vi, com um novo olhar. E entendi que o atalho não lhe rendeu tanto mel, e que em suas asas, havia apenas as marcas da poeira da estrada.

E agora a estrada, que se fazia nova para mim, também se abria em possibilidades inúmeras à sua frente.

Já é outono, e precisamos colher os frutos. Vamos continuar nossa caminhada. Nosso ritmo é sempre diferente. Você sempre se adianta, ou se atrasa... É preciso acertar o passo, pois os frutos estão maduros, e não podemos perdê-los.

Não podemos retardar a caminhada. Não vamos reduzir os passos. Os frutos estão maduros. Logo se fará noite, e à noite, já terei saído do caminho, já terei atingido a minha meta. Mas, quero chegar à minha noite, com um cesto repleto de frutos: maduros e doces.

Da minha bagagem, de tristezas e decepções, quando o coração árido e maltratado pulsava soluçando, levo apenas a lembrança, pois, hoje, carrego comigo a certeza de que nem os ventos, nem a tempestade, são capazes de arrancar o meu amor pela vida, e o meu entusiasmo de buscar a cada novo dia, em cada curva da estrada, o refrigério que só encontro no regaço de Deus.

  (Por Socorro Melo)


terça-feira, 9 de maio de 2017

"O PAI E EU SOMOS UM"





«O Pai e Eu somos um»


No dia da festa de Santo Agostinho, acabava eu de comungar, quando compreendi, quase podia dizer que vi – não sei explicar como, sei apenas que isto se passou no meu intelecto e que foi muito rápido –, de que forma as três Pessoas da Santíssima Trindade, que tenho gravadas na minha alma, são uma mesma coisa. Isto foi-me mostrado por meio de uma representação verdadeiramente extraordinária e numa luz extremamente viva. O efeito que a minha alma experimentou foi muito diferente daquele que a visão da fé produz em nós. A partir desse momento, não consigo pensar numa das três Pessoas divinas, que não veja também que são três.

Perguntava a mim mesma como era possível que, constituindo a Trindade uma unidade tão perfeita, só o Filho Se tivesse feito homem. O Senhor fez-me compreender de que forma as três Pessoas, sendo uma mesma coisa, são contudo distintas. Em presença de tais maravilhas, a alma experimenta um novo desejo de escapar ao obstáculo do corpo, que a impede de delas usufruir. Embora pareçam inacessíveis à nossa baixeza, e a sua visão termine imediatamente, a alma retira delas mais proveito, sem comparação, que de longos anos de meditação, e sem saber como.


Santa Teresa de Ávila (1515-1582), carmelita descalça, doutora da Igreja 
As Relações, 47