Pegadas de Jesus

Pegadas de Jesus

sexta-feira, 27 de janeiro de 2017

LUTA INTERIOR






E quando menos se espera uma palavra ou uma expressão discorde, coloca à prova todo um processo de busca pela paz e serenidade. É difícil conviver. É difícil aceitar o que é diferente. É muito mais difícil respeitar a liberdade de pensamento do outro sem ofensas.

Travei uma grande luta interior para entender isto. Percebi, após duras penas, que é mais sábio calar, deixar de expressar meus sentimentos ou opiniões, com quem não sabe ouvir e compreender. 

Perdi e ganhei com isso. Perdi a esperança de ter alguém com quem pudesse conversar, falar de sonhos, de ideias, e da vida, alguém onde eu pudesse me derramar, me aconchegar, me dividir... Ganhei, no entanto, quando entendi a limitação do outro, sua incapacidade de dar aquilo que não tem: equilíbrio, maturidade, serenidade, doçura, compreensão...

O silêncio foi a melhor resposta que encontrei. Já optei por este caminho uma vez, e me foi favorável, vou me utilizar sempre dele, quando preciso for. Há situações em que é melhor nos amordaçar.

Fico pensando no quanto perdemos, em toda riqueza de vida, de interação, de cumplicidade, de companheirismo, com as nossas atitudes impensadas, nosso jeito rude de falar, nossa falta de sensibilidade no trato com as pessoas. O quanto nos afastamos, de quem amamos, muitas vezes, por causa de nossos caprichos.

Fiz isso tantas vezes. Quis impor minhas verdades, meu jeito de ser, de pensar, de ver o mundo. Com certeza machuquei, humilhei, porque é impossível que um comportamento egoísta não deixe marcas, até mesmo feridas. E me feri também.

Até que um belo dia despertei, e vi o quanto estava utilizando errado os talentos que Deus me deu. E dei início a um processo de volta, de recuperação de tudo quanto me equivoquei. Nada fácil. A pior fase desse processo é manter o equilíbrio das emoções, é entender que os outros não despertaram ainda e que como eu são dominados pelo ego.

E acabei, de certa forma, tendo que mudar algumas atitudes, alguns pensamentos, a fazer considerações, a olhar certas coisas com um jeito novo, a renunciar a certos pontos para alcançar serenidade e paz.

Consegui lograr muito com minha nova forma de pensar e de agir. Todavia, fica sempre um vazio, um desejo, de poder compartilhar com outros o que carrego dentro de mim, e sei que não posso, pois, corro o risco de ser mal interpretada, retrógrada, incompreendida. É melhor calar. Optar pelo silêncio, e deixar que cada um aprenda com seus próprios erros, que não somos ilhas, que precisamos desaguar nos outros, que as diferentes opiniões podem ser motivos de aprendizado.

Á medida que vivo, aprendo. Já aprendi o suficiente para não querer mais impor minhas ideias, nem querer mudar ninguém. Já foi suficiente as bofetadas que a vida me deu, a cada vez que quis ensinar um caminho melhor para os outros e acabei rotulada de chata e de intrusa. 

Cansei das críticas. Agora não. Não mais. Não vou me deixar afetar por egos inflados. Vou ficar apenas olhando da minha janela. Eu não tenho mais tempo a perder. Eu preciso crescer. Preciso preparar minha bagagem com coisas novas. E me esvaziar de tudo que seja contrário à minha busca pela paz.

Por Socorro Melo

sábado, 21 de janeiro de 2017

DOIS CORAÇÕES

Da Net

´"Eu guardo em mim
dois corações
um que é do mar
um das paixões
um canto doce
um cheiro de tem...poral
eu guardo em mim
um deus, um louco, um santo
um bem e um mal
eu guardo em mim
tantas canções
de tanto mar
tantas manhãs
encanto doce
o cheiro de um vendaval
guardo em mim
o deus, o louco, o santo
o bem, o mal…” Danilo Caymi



Eu não conhecia essa canção do Danilo Caymi, até poucos dias. E quando a ouvi me pus a refletir. De fato, todos  guardamos dois corações,  e todos somos deuses, loucos ou santos em determinados momentos de nossas vidas.

Nós somos uma dualidade. Nós temos além desse corpo físico um ser interior que nos define. Um ser que pensa inteligentemente, que tem suas opções preferenciais, que tem vontades, desejos, que sabe argumentar, que toma decisões, que faz escolhas, que tem atitudes, que participa, que se retrai, um ser feito de razão e de emoção. Um ser livre.

E com essa liberdade que nos é dada, vamos construindo nossa história, edificando nossa vida, abrindo e fechando caminhos. E é grande a nossa responsabilidade na escolha de nossas preferências, pois, elas podem nos render tanto uma vida de sucesso quanto de amarguras e decepções.

Viver é um engenho, é uma arte. Precisamos nos munir de todo talento, de toda capacidade, de muita criatividade e bom humor para  levar adiante essa construção de forma desejável.

Não se pode perder um minuto na vida. Tudo conta a nosso favor ou contra nós. O que fazemos hoje tem reflexo na nossa vida amanhã. Podemos acertar ou errar, seja o que for, vamos colher os frutos do que plantamos.

Mas, podemos folgar com a certeza de que errando, podemos corrigir e dar um novo rumo à construção, basta que nos conscientizemos daquilo que  é realmente  o objetivo a ser atingido.

E quantas vezes damos murros em ponta de facas. E agimos de forma egoísta, como loucos, desrespeitando o espaço e a dignidade dos outros, querendo nos impor ou impondo nossas ideias e interesses.

E somos obrigados a juntar os cacos do nosso coração, que por vezes, ainda altivo, não aprende a lição. E são tantos os disparates, conforme o tamanho da insensatez.

Alimentamos o santo quando adotamos uma forma altruísta de viver. Quando enxergamos que além de nós existem mais. Quando somos capazes de nos ignorar, para  atender a necessidade de outro que é mais urgente, sem medir esforços e sem impor condições, quando deixamos aflorar sentimentos e virtudes nobres, como a generosidade, a compaixão, o acolhimento, o desapego, que aos olhos de muitos pode parecer loucura ou utopia, mas, que nos garante uma felicidade ímpar que nenhum bem material pode compensar.

Todavia, quando nos sentimos deuses, e sabemos que guardamos em nós essa possibilidade, atingimos o cúmulo da idiotice. O orgulho e a soberba nos levam a entender que somos superiores aos demais, mais dotados, mais expertos, mais agraciados, mais merecedores e por fim, acreditamos nisso.

E nos comportamos como rolos compressores, cegos e violentos, passando por cima de qualquer que venha ameaçar a nossa posição.

Todas essas possibilidades estão guardadas nos dois corações. Um guarda a doçura, o outro o fel. Um guarda o amor desinteressado, o outro as paixões desordenadas. Um guarda a felicidade o outro a desventura.

E tudo depende de nossas escolhas. A partir da mais ínfima. A vida é o que nós decidimos fazer dela. Para isso fomos presenteados com a liberdade. Porém, temos que compreender que vamos responder, cedo ou tarde,  pelo uso dessa liberdade.

O coração que é alimentado é aquele que vai se sobressair.  Priorizemos o coração que é leve, que não tem amarras, que guarda a simplicidade, que guarda o mar, o encanto doce, àquele que tem olhos e que enxerga mais longe, além do horizonte.

Por Socorro Melo


quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

VENEZA



By Socorro Melo


Era bem cedo ainda quando saímos do nosso Hotel em Mestre para ir à Veneza. Os termômetros marcavam dois graus.  Eu não tenho palavras para descrever a emoção que me dominava naquele momento. Dali a poucos instantes pegaríamos um barco para fazer a travessia. Tudo em volta era tão diferente, tão bonito.

Quanto eu sonhara com Veneza! Desde a adolescência alimentava esse desejo. Era incrível que estivesse bem perto de conhecê-la, de respirar-lhe o ar, de pisar no seu solo, de olhar pro seu céu, de navegar no seu mar…

E chegamos ao Porto. E ocupamos nossos lugares no Vaporetto (barco motorizado que faz o transporte público até a ilha). Enquanto ele deslizava por aquelas águas de um verde límpido e de intenso brilho, naquela manhã de outono, meus olhos íam vislumbrando uma beleza que nem parecial real.

O vento gelado e o balanço do barco me faziam tremer, de frio, mas,  também de um pouco de ansiedade, de emoção. Cobri a cabeça com a echarpe na tentativa de ficar mais confortável.

Aos poucos Veneza ia se desenhando à nossa frente. Barcos atracados,  torres, casario, cúpulas de imponentes igrejas e o campanário de São Marcos. Senti vontade de chorar, de verdade. Enfim, chegamos.

Pude perceber, de um soslaio, que Veneza era diferente de todas as cidades que eu já conhecera. Nenhuma era flutuante e desafiadora quanto ela. Veneza tem, além da beleza, uma história impressionante.

E ali estava eu. - Prazer em conhecê-la, princesa do mar, disse em meus pensamentos.

A Veneza dos Doges, dos tribunais, dos grandes compositores, como Vivaldi, e dos grandes carnavais, das gôndolas, das pontes e dos canais, da arte e da música, estava ali diante mim, era demais…

E deslumbrada,  eu registrava tudo em minha memória, tudo que os meus olhos em festa me presenteavam, como um sedento diante de uma fonte de água.

Quantas particularidades. Veneza, creio, é a única cidade do mundo onde não circulam carros. Porém, o tráfego, respeitando-se mão e contra-mão é feito pelas pessoas.

Cada passo, uma aventura.  Conheci e me encantei com a Basílica de São Marcos, o evangelista, com a arquitetura, com os afrescos, e com o belíssimo interior, onde são guardadas as relíquias do santo e onde repousam seus restos mortais.

A Praça São Marcos é outro grande ponto turístico. É repleta de lojas, de cafés, de restaurantes, finos e elegantes, e no centro, grande quantidade de pombos que a tornam mais bonita.

Dos cafés ouvíamos músicas clássicas tocadas e cantadas ao vivo. E um grande burburinho de turistas vasculhando cada centímetro daquele lugar mágico, em busca de souvenirs, de comida ou do lugar perfeito para uma self, a ver pelos seus semblantes, todos encantados, como eu, de cara pra cima registrando tudo, apreciando os belos e históricos prédios e o campanário.

Comemos massa, degustamos vinho, vimos uma demonstração de como é trabalhado o vidro até se transformar nas maravilhosas e famosas peças de cristal, expostas ali naquela loja, conhecidas como cristais de Murano.

Atravessamos pontes, visitamos Museus, mas a grande emoção foi, de fato, navegar na gôndola, por entre os estreitos canais conhecendo as ímpares ruas de Veneza.

E quando o dia declinou, e com ele o ocaso do sol, Veneza nos surpreendeu com uma beleza poética,  envolvida pelos raios do sol poente que douravam suas águas, deixando-a mais romântica, mais atrativa, mais adorável e inesquecivelmente mais Veneza.

E foi neste clima de quase êxtase diante de tanta beleza que nos  despedimos, já com vontade de voltar, e com a grata satisfação de saber concretizado um lindo sonho.

Buono te conoscere Venezia!


Por Socorro Melo

sábado, 14 de janeiro de 2017

REMINISCÊNCIAS



Eu já estava cansada de contar carneirinhos. Iniciara a terceira centena e nada de sono, quando ouvi ao longe uma música bem antiga que me remotou ao passado, à minha infância.

Era o ano de 1967. Eu e Beto tínhamos cinco anos. Beto é meu primo. Morávamos numa pequena vila do agreste pernambucano. Nesse tempo, algumas melhorias começavam a chegar à vila, tais como a luz elétrica, a água do chafariz e o rádio. O rádio era o único meio de comunicação por ali, e era um artigo para poucos.

Meu tio, o pai de Beto, comprou um rádio. Todo mundo soube do acontecimento. Na vila, ávida de novidades, o que se passava na casa dos outros era sempre o assunto do dia.

O rádio foi posto numa pequena prateleira, fixada na parede. A prateleira fora forrada com um paninho branco, triangular, com um delicado bordado na ponta, e do lado do rádio, um jarrinho com flores naturais.

Naquela noite a vila em peso compareceu à casa do meu tio para ouvir o rádio. Na sala de visitas foram dispostas cadeiras e bancos dos quatro lados. Os adultos ficaram sentados, ocupando todas as cadeiras, só não me recordo se havia crianças, além de mim e de Beto.

Quando o rádio foi ligado, por volta das vinte horas, quanta emoção! Foi sintonizado numa estação de  rádio chamada Difusora, da cidade de Pesqueira, nossa vizinha. Havia um programa chamado Postais Sonoros, onde os ouvintes mandavam cartas à Radio, solicitando músicas e oferecendo aos amigos e familiares por ocasião de aniversários, casamentos, formaturas, etc. Foi este o primeiro programa que ouvimos no rádio, e que passou a ser o de outros fins de semana, para toda aquela gente da vila.

O centro da sala ficou vazio, obviamente, já que as cadeiras estavam dispostas nas laterais.

Eu e Beto, o que criança não inventa, resolvemos dar um show. Ficamos dançando no meio da sala. A dança não passava de um arrasta pé, de um lado para o outro, do começo até o fim do dito programa. Juntinhos, às vezes de mãos dadas, lá estávamos nós, a postos, esperando o locutor terminar sua fala e começar uma nova música. E àquela música, que eu ouvia ao longe, era uma das que nós havíamos dançado.

Ah, e a platéia gostava, e aplaudia. Era uma gente alegre, simples, de bom coração. Na vila, todos se respeitavam, se ajudavam mutuamente, e precisavam de tão pouco para serem felizes. Fez parte das minhas origens, e tanto aprendi dessa simplicidade.

Velhos tempos. Belos dias. Assim como bem disse o poeta.

Por Socorro Melo

sexta-feira, 13 de janeiro de 2017

AGRADECIMENTO AO LEITOR


Imagem da Net



Há quase sete anos eu criei o meu Blog, o Seguindo Minhas Pegadas (http://msocorrom.blogspot.com.br/). Uma página despretensiosa, que tinha e tem por finalidade apenas expressar um pouco do que penso e interagir com outras pessoas que também gostem de comunicação. Nos primeiros anos fui muito ativa, depois, por falta de tempo ou mesmo por negligência parei de escrever. No final de 2016, incentivada por algumas blogagens coletivas (quem é blogueiro sabe o que é isso) voltei a escrever. Nesses sete anos conheci, virtualmente, muitas pessoas com as quais me identifiquei. Algumas até já fizeram a grande viagem, e eu senti como se as conhecesse pessoalmente, exemplo da Glorinha Leão e da Welse. Alguns amigos são bastantes fiéis, pois, apesar da minha ausência, nunca deixaram de me acompanhar, caso, entre outros, da Norma EmilianoRoselia BezerraToninhobira Reis, Élys, Chica, e as portuguesas Fernanda Cerqueira Fernandes e Elvira, e me perdoem os que não consegui lembrar do nome.

Curiosamente acessei as estatísticas do Blog e fiquei surpresa com o número de visualizações da minha página, nunca tinha observado isso. Para uma página simples e despretensiosa achei fantástico. Não sei até que ponto estas estatísticas são confiáveis, mas, pela recorrência de algumas postagens, penso que as minhas mensagens têm transmitido um pouco de esperança, de emoção e de amor à vida. É o motivo do meu agradecimento. E o mais interessante, é que há muitas visualizações em países que eu nunca conseguiria imaginar, tipo Ucrânia, Polônia, Alemanha, China, mas, o maior número é dos Estados Unidos. Não há como não me espantar. Agradeço a Deus por isso e a cada leitor do meu Blog, e que Ele me conceda sempre a inspiração para deixar em minhas singelas mensagens algo de bom que possa despertar em cada leitor uma grande paixão pela vida. 

Thank you!


"I am the way and the truth and the life" JC

quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

JANELAS




Imagem da Net



É conveniente abrir as janelas. O ambiente precisa ser arejado, agradável, habitável... Janelas são sempre espaços de saída, de libertação, de inovação. Até mesmo as janelas da mente.

Eu tenho quatro janelas que considero especiais. Todo mundo tem.

A janela rosa, guarda a parte de mim que todo mundo conhece. Nela não há segredos. Está sempre escancarada. 

A janela amarela é aquela onde estão guardadas as coisas que só eu sei, eu e Deus, ninguém mais. Ela fica sempre fechada, exceto quando, esporadicamente é açoitada por algum vento forte.

A janela marinho, todo mundo conhece, menos eu.

A janela azul, somente Deus conhece, nem eu. Ela guarda o meu mistério. 


É mais ou menos assim que imagino a minha dimensão psicológica, baseada, claro, em conceitos da própria Psicologia. Mas, não é de conceitos que quero discorrer, pois, nada entendo sobre eles, quero apenas considerar que as imagens utilizadas são bastante apropriadas. É assim mesmo que eu sou. 

A janela rosa torna visível a forma como eu me comporto e atuo no mundo. Deixa à mostra os meus gostos, prazeres, crenças, lutas, aspirações, dores, sofrimentos, superações, conquistas, vitórias. Qualquer um pode fazer uma imagem de mim, conforme o que se vê da minha janela.

A janela amarela, como disse, só eu tenho acesso. Vez por outra, quando uma emoção forte a açoita, ela me deixa entrevê coisas que eu nem gostaria. São meus traumas, são meus fracassos, minhas incapacidades, minhas perguntas sem respostas, meus medos, meus pecados. A minha miséria, é o que guarda essa janela amarela. E quando ela abre pequenina fresta, eu sou invadida por grande inquietude, indignação,  tristeza. Enfim, ela traz à tona aquilo que está no meu inconsciente, àquilo que quero esquecer, que preciso cuidar, para que não seja pedra de tropeço no meu caminho, e que não venha impedir a minha escalada. A Psicologia a chama de janela killer.

A janela marinho é a parte de mim que o mundo conhece, e eu não. Eu não tenho como saber o que as pessoas pensam de mim, que imagem fazem de mim, quais são os seus julgamentos ao meu respeito. Aquilo que eu faço, ou digo, pode ser recebido ou entendido pelos outros de forma bem diversificada da minha real forma de pensar ou de compreender. Eu não tenho como saber, sinceramente, o que é que eu sou para os outros, mesmo que de alguma forma se manifestem.

A janela azul, anil, da cor do céu, é a janela de Deus, aquela que só Ele conhece, que guarda o mais precioso de mim, o mistério de quem sou eu verdadeiramente. Esta também é fechada, mas, tem uma vidraça que, de vez em quando, me deixa entrever através do véu, alguns sinais que me indicam como me conhecer melhor, e como fazer essa experiência com Deus. Considero sagrada essa janela. Talvez por que o mistério sempre nos encante. É aqui, diante do mistério, que vislumbro o que almejo, é aqui que deposito minhas grandes esperanças, é aqui que as dúvidas se aquietam, é aqui que ouso crer que sou muito mais do que penso, e que o meu ser vai alem dessa jornada. É aqui, nessa janela, que vislumbro um mundo melhor que me faz arregaçar as mangas e começar construí-lo, desde já. Esta é a minha janela da fé.

Por Socorro Melo

quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

BATISMO DE FOGO



Dificilmente conseguimos associar beleza e sofrimento. Em nossa concepção, normalmente, pintamos o sofrimento com cores mais sombrias. No entanto, é possível percebermos o belo nas experiências de dor.

 Na tela da minha mente as imagens iam se moldando, à medida que a senhora Engrácia me contava a sua história. Quem por ventura se aproximasse de nós, e se pusesse a escutar aquela história, a partir daquele instante, poderia imaginar que sem sombra de dúvidas, tratava-se de um filme, de terror.

As cenas eram chocantes.Contava-me ela, com os olhos marejando, como ocorrera o assassinato de sua filha, há quinze anos. Dizia-me que presenciara toda cena, e que o tempo apenas conseguira retirar o desespero e suavizar a dor, porém, o sentimento de perda  permaneceu constante.

Eu, que sou mãe também, tentei à custa, me colocar no lugar daquela mulher. Uma sensação incrivelmente desconfortante se apoderou de mim. Não consegui imaginar meu filho no lugar da filha dela, é inconcebível para uma mãe chegar a esse ponto.

À medida que ela  narrava-me a maneira brutal e injusta de como perdera sua filha, invadia-me uma certa revolta. Em poucos instantes eu me encontrava mais emocionada do que ela. Percebia até que ponto o sofrimento e a dor podem nos assaltar, e o quanto a impotência nos limita. Percebia a nossa vulnerabilidade, a nossa fragilidade diante da vida.

Perante tudo o que ouvia, surpreendeu-me imensamente o final da história: a senhora Engrácia perdoara o assassino de sua filha. Em momento algum durante a sua narrativa, referiu-se a ele se utilizando de palavras ásperas, nem proferiu qualquer maldição e nem percebi no seu semblante qualquer gesto que denotasse ódio, mágoa ou ressentimento.

Enquanto minha pobre mente já fazia julgamentos sobre aquele infeliz que tinha roubado a vida daquela jovem, meus olhos quase arregalados se encantavam com a beleza do que viam à frente: a beleza no sofrimento. Só tristeza.

Como é possível para uma mãe, perdoar de verdade, alguém que lhe rouba o que há de mais precioso em sua vida, um filho? Custava-me acreditar que isso fosse possível. Mas, diante de mim estava a realidade não crível: a senhora Engrácia.

Ela cresceu tanto diante de mim, que quase não conseguia vê-la. Seus cabelos brancos, e as marcas visíveis da passagem do tempo, no seu rosto, concebiam-lhe um ar quase sobrenatural. Procurei, disfarçadamente, ver sua auréola. Meu Deus, pensei emocionada, como é tão grande a nobreza daqueles que sabem perdoar! E como me incomodou constatar que estou ainda tão distante dessa grandeza de espírito.

Depreendi o belo, oculto no sofrimento. Não nas atitudes de rudeza, de selvageria, mas na elevação espiritual de uma alma entregue ao amor de Deus,  que se tornou capaz de perdoar, e de absolver uma outra tão necessitada de misericórdia. A grandiosidade do perdão, a sua particularidade, incita em nós, quando nos deixamos por ela envolver, uma ardente vontade de amar, e de rever nossos conceitos e nossas desarmoniosas concepções. Sou-lhe muito grata, senhora Engrácia, por dividir comigo o momento mais doloroso, mas também o mais nobre da sua vida, o seu batismo de fogo, a candura da sua alma.

(Socorro Melo) 

domingo, 1 de janeiro de 2017

RUFLAR DE ASAS




Encerrei o último capítulo do livro 2016, da minha vida, vendo um espetáculo de fogos de artifício, abraçando minha família e derramando lágrimas por meu irmão que já não se encontra entre nós. Também agradeci a Deus pela graça de viver mais um ano, mais um tempo de oportunidades, que me foi dado.

Refleti sobre a bondade de Deus, sempre tão providencial para comigo, pelos mimos recebidos, pelo dever cumprido. Refleti sobre os meus fracassos, meus esforços,  minhas alegrias,  e as pendências que ficaram como saldo para  2017. Pela primeira vez fechei somente as minhas próprias contas.

Nada a reclamar da vida, que é essencialmente generosa. Somente um pouco de melancolia, por  constatar fatos e possibilidades inerentes à fragilidade humana.

Enxuguei as lágrimas, sorvi um gole de espumante e ruflei as asas, para iniciar o novo ano com atitudes positivas, com propósitos renovados, com esperanças.

Ruflar as asas significa  sair do estado de inércia, de torpor, de melancolia, jogar tudo fora e começar um novo tempo usufruindo de todas as possibilidades de crescimento.

Desejo fazer um prefácio bonito no Tomo 55 da minha história. Pretendo escrever um roteiro leve, divertido, mas cheio de sentidos e  de capítulos marcantes. Muito da rotina será preservado, o que é bom, e farei, com a graça de Deus, acontecerem outras situações igualmente importantes, agradáveis e ricas de significados.

Estou de pé diante de uma longa estrada, a 2017. Posso vislumbrar frondosas árvores circundando-a, muitas flores silvestres, passarinhos e borboletas voando... Posso ouvir silvos e chilros, ver arbustos e pedras, elevações íngremes, mas também curvas, que me fazem perder de vista o fim dessa estrada. O fim da estrada é um mistério, está coberto por um véu intransponível, porém, sinto também uma presença confortadora, um companheiro inseparável que irá comigo nessa estrada, e que me garante que a curva é apenas uma curva, e que por trás da encosta o sol brilha ainda mais.

Vou ruflando as asas. Fazendo ruído. Alçando voo. Começa agora minha aventura. algo dentro de mim se agita, pulsa, impulsiona, instiga: é o ânimo, a vontade de viver, de voar mais alto, de desfrutar desse dom maravilhoso que é a vida, tão generosamente ofertada, doada, pelo soberano Criador. 

Quero seguir-lhe as pegadas, confiar que estou segura, repousar, pois viver nada mais é do que se lançar no grande milagre da vida, na aventura de amar.  Quero ter paz e promover paz e rezo pela paz do mundo inteiro, e por cada pessoa humana, parceiros desta caminhada sobre a terra.

Esta é a primeira página do livro 2017 da minha vida.

Obrigada por estarem aqui, e por tornarem a minha vida mais feliz! Paz!

Bem vindos!